Bastou a metade do aumento na cobrança do IPTU carioca para gerar R$67,5 milhões a mais na receita da Prefeitura do Rio. Foi o que mostrou a reportagem exclusiva do jornal O Globo, na qual o advogado David Nigri participou, na reta final para contestação do valor.
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RIO – A prefeitura arrecadou R$ 67,5 milhões a mais (em valores corrigidos pela inflação) com o IPTU no primeiro bimestre deste ano, em comparação com o mesmo período de 2017. O crescimento real de 5,8% na arrecadação (de R$ 1.159.453.586 para R$ 1.227.002.699) após as mudanças nas regras de cobrança do tributo aprovadas pelos vereadores em 2017, no entanto, oculta um outro dado. Quando o critério é a divisão da receitas de IPTU previstas inicialmente nos orçamentos de 2017 e 2018 com o que foi efetivamente arrecadado, houve uma queda de 2,5% do total.
Os dados, que foram divulgados pela prefeitura nesta quinta-feira no Fincon (sistema de acompanhamento orçamentário da prefeitura) foram tabulados pelo gabinete de vereadora Teresa Bergher (PSDB), a pedido do GLOBO. Na avaliação de tributaristas, os resultados indicam duas hipóteses: ou uma tendência para o crescimento da sonegação por contribuintes que não tiveram condições de arcar com o reajuste que em casos passou de 70%, ou pode ser um indicador que pode ter aumentado o número de pessoas que optaram por parcelar o tributo em dez vezes em lugar de quitar o IPTU em cota única, com 7% de desconto.
Os R$ 67,5 milhões do primeiro bimestre correspondem a no máximo 22,5,% da receita extra (entre R$ 250 milhões e R$ 300 milhões) que a prefeitura estima arrecadar a mais em 2018. No total, a arrecadação prevista com o IPTU chega a R$ 2,9 bilhões.
O advogado tributarista David Nigri lembra que os novos valores cobrados este ano correspondem a apenas 50% do reajuste. A outra metade será cobrada apenas em 2019. Outro dado curioso é que a arrecadação no primeiro bimestre ficou bem abaixo do aumento da base de contribuintes. Com as alterações das regras, o tributo passou a ser cobrado de aproximadamente 60% (cerca de 1,050 milhão) dos mais de 1,9 milhão de imóveis do Rio (cerca de 1,050 milhão). Até 2017, o imposto era cobrado de somente 760 mil imóveis (40% do total). Cerca de 250 mil contribuintes pagavam apenas a Taxa de Coleta de Lixo.
— O reajuste foi excessivo por ter sido aprovado em um cenário ainda desfavorável da economia brasileira. O contribuinte ainda sofre efeitos da crise econômica, que foi mais aguda no Rio de Janeiro. As regras mudaram em um momento que a população ainda está descapitalizada. Um exemplo disso são os servidores do governo do Estado que durante muito tempo receberam salários em atraso — disse Nigri.
Os dados só foram liberados ontem nesta quinta-feira, apesar do caixa da prefeitura ter sido aberto desde a semana passada. O Fincon, porém é um sistema de acesso restrito, acessado por senha por parlamentares e servidores públicos. Até às 20h30, as informações ainda não haviam sido liberadas para o Rio Transparente, site aberto ao público. Em nota, a secretaria municipal de Fazenda contestou os dados divulgados pela Câmara do Rio, alegando que poderiam estar indicado apenas parte das receitas apuradas . No entanto, ao dar sua versão sobre a arrecadação, a SMF divulgou valores nos quais somou as receitas do IPTU e da Taxa de Coleta de Lixo (TCL), que também é cobrada no carnê. Questionada sobre quanto foi a arrecadação apenas com o IPTU, a SMF não respondeu. Pelo critério da Secretaria de Fazenda, somados os dois tributos a arrecadação cresceu 8,4% no primeiro bimestre entre 2017 e 2018.
As mudanças nas regras do IPTU atualizaram regras de cobrança que estavam em vigor desde 1996. A nova lei do IPTU atualizou uma planilha conhecida como planta genérica de valores usada para calcular o tributo. Uma série de isenções também foi revista. Os resultados da arrecadação não surpreenderam Teresa Bergher:
— A população de uma resposta à prefeitura pelo aumento desproporcional do IPTU. Muitos cidadãos preferiram perder o desconto de 7% da cota única seja por não ter dinheiro para quitar o imposto ou em protesto contra a prefeitura. Eu mesma, por discordar do reajuste, optei por pagar meu imposto parcelado — disse Teresa, que vai encaminhar ao executivo requerimento de informações para saber o total de contribuintes que decidiram quitar o imposto em cota única.
A polêmica sobre a cobrança do IPTU também se transformou em batalha judicial . Em dezembro, um grupo de vereadores e deputados estaduais entrou na Justiça questionando a nova metodologia de cálculo. O Órgão Especial do Tribunal de Justiça chegou a conceder uma liminar para suspender a cobrança. No entanto, a prefeitura recorreu e a liminar foi cassada pela presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Carmen Lúcia. Ainda não há previsão de quando o caso terá um desfecho. Segundo a decisão de Carmen Lúcia, a cobrança pelas regras atuais será mantida até que o processo tenha sido analisado até a última instância.
— Espero que o Judiciário tome uma decisão rápida. As pessoas querem organizar sua vida financeira. Não querem ficar inadimplentes. Mas estão com dificuldades para suportar o reajuste — disse a deputada estadual Lucinha (PSDB).
Fonte: O Globo